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Um diálogo necessário: comunicar em educação e os instrumentos tecnológicos

Texto sobre comunicação e os instrumentos tecnológicos, para o curso de Mídias na Educação.
Este texto apresenta algumas discussões a respeito da comunicação e da educação frente aos instrumentos tecnológicos tão presentes entre os sujeitos. Baseando em Freire, Vygotsky, Marco Silva e outros autores levanta-se um questionamento que relaciona a tríade que, enquanto formação, desvelou-me indissociável. Propôs o entendimento por comunicação, dialogicidade, instrumentos e mídia, a tecnologia na educação, as relações sociais e suas mazelas.
Palavras-chave: Comunicação. Educação. Instrumentos Tecnológicos. Mídias.

Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino. Paulo Freire.
As mídias estão cada vez mais presentes entre os indivíduos. Os recursos tecnológicos agregam novas funcionalidades, acirram o mercado, ampliam o consumismo. Novos autores, ou ao menos, veiculadores disponibilizam uma enormidade de informações a todo instante. E a escola, o que tem ocorrido nela enquanto a sociedade vive uma transformação provocada em época em que os instrumentos tecnológicos estão arraigados?

Um diálogo necessário: comunicar em educação e os instrumentos tecnológicos

A busca pela compreensão de si e do outro, para se perceber no mundo e para percebê-lo jamais foi recente. Tal inquietação é movida pelo que se entende por comunicação; um termo cheio de significados que se amplia, adquirindo novos recursos, encurtando caminhos, modificando e sendo modificado pelos seres que procuram apreendê-lo e assim não pode ocorrer por apenas um indivíduo, exige a relação, o comprometimento, a ida e a volta, a necessidade de mais que um emissor e um receptor, mas que a todo instante, estão presentes os dois papeis.

O sujeito pensante não pode pensar sozinho; não pode pensar sem a co-participação de outros sujeitos no ato de pensar sobre o objeto. [...] Esta co-participação dos sujeitos no ato de pensar se dá na comunicação. [...] Implica numa reciprocidade que não pode ser rompida. [...] A educação é comunicação, é diálogo, na medida em que não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam a significação dos significados. (FREIRE, 1985, p. 45-46).

Entendendo educação como comunicação, como diálogo, estamos diante de dois dos sujeitos da escola que necessitam desta relação para que se afirme o ensino e a aprendizagem. São eles, professor e aluno. O professor necessita preparar-se; e não é tarefa simples, em contato com o aluno, manter uma relação que o permita dialogar. Dialogar é um ato de se permitir ao outro, de permiti-lo e às suas contribuições sobre seu mundo. Paulo Freire (1987, p. 45), afirma que diálogo é o encontro dos homens, não se esgota numa relação, é o caminho pelo qual os homens ganham significação enquanto homens, os sujeitos são mediatizados pelo mundo.

Beauclair (2007, p. 43-44), ao referenciar-se com Paulo Freire, afirma que “nessa mediação, o mundo de um pode ser percebido e apropriado pelo outro, com as diferentes percepções de cada um complementando a busca de sentido para o humano existir de todos”. A educação, não deve ser entendida como um processo da instituição escola, mas como o percurso na mediação, o diálogo, a comunicação, que ocorrem com os sujeitos a todo instante, nos diversos meios, em contado direto e indireto, próximo ou distante. Há uma noção de espaço e tempo que se fazem permitidas quando permitimo-nos à dialogicidade.

De modo algum uma aula não será planejada, não contará com momentos em que o professor irá expor os conteúdos, direcionando-a; tais ações fazem com que o conhecimento seja apropriado se a liberdade na comunicação entre professor e aluno seja bidirecional. E mais, amplia-se a possibilidade de construção e expansão deste conhecimento. Paulo Freire trata de esclarecer que:

A dialogicidade não nega a validade de momentos explicativo, narrativo em que o professor expõe ou fala do objeto. O fundamental é que o professor e alunos saibam que a postura deles [...] é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O que importa é que professor e alunos se assumam epistemologicamente curiosos. (FREIRE, 2002, p. 52).

Ao relatar sobre comunicação, não se pode negar as modificações que o indivíduo propõe e é instigado à inserção em sua vida, diante dos inúmeros recursos tecnológicos. A presença nos diversos segmentos é inegável; de algum modo, o ser humano participa ou se vê presente às mudanças provocadas na sociedade.

A tecnologia na educação tem provocado - como em outros meios - a necessidade de criar, de adaptar, de ‘mais’ estar em constante formação, do indivíduo rever seus movimentos ao lidar com os instrumentos que a tecnologia agrega.

Com a introdução de novos instrumentos em suas ações, estágios anteriores são suplantados progressivamente, dando origem a novas formas de atividade. O reequipamento por meio dos instrumentos culturais seria, desse modo, a força motriz responsável pelo processo de desenvolvimento humano. (VYGOTSKY e LURIA, apud DURÁN, p. 2).

Em Vygotsky constata-se que os instrumentos tecnológicos não lidam por si das mazelas que vive o ser humano, mas provocam um novo estado no entendimento sobre educação, sobre comunicação. Novamente, se está diante da relação social, do conhecimento que é absorvido, provocado, criado, por intermédio da troca entre os indivíduos e deles com o meio. São as relações entre os indivíduos, maiores responsáveis por seu desenvolvimento; ou é, os instrumentos tecnológicos são parte das mudanças na humanidade, mas não se deve responsabilizá-los, por exemplo, pela qualidade da educação.

Na comunicação e na educação, é preciso propor situações que o indivíduo vivencia ou poderá vivenciar em outros meios sociais. A escola seria um lugar de constantes movimentos em acordo com que o indivíduo tem ou poderá ter disponível para além de seus muros. Comunica-se conforme o que se vive; a educação não é algo estático, não se trata de transmissão do mesmo, mas de constantes mudanças “refazendo” o conhecimento. Isso se faz com o meio, sobre ele; há que experienciar, testar as sensações, instigar percepções, mover-se com o movimento do que o cerca.

Este movimento é transformar, é tornar-se novo frente ao novo. Não se está supervalorizando o uso de instrumentos, ou propondo que eles sejam os responsáveis por possíveis saltos de qualidade; há certamente que lidar com questões socioculturais que dificultam acesso, mas ficar à margem, é parar no tempo, é ser dominado. Com a inserção de novos instrumentos na educação - já evidente, é preciso transformar o modo que se comunica, seja com o meio, com os recursos ou com o outro sujeito, e isso tem ocorrido pela mediação.

Pierre Lévy (2011, p. 137, 146), afirma que:
A inteligência ou a cognição são o resultado de redes complexas onde interagem um grande número de atores humanos, biológicos e técnicos. Não sou “eu” que sou inteligente, mas “eu” com o grupo humano do qual sou membro, com minha língua, com toda uma herança de métodos e tecnologias intelectuais.
[...] toda estrutura social só pode manter-se ou transformar-se através da interação inteligente de pessoas singulares.

O que se vivencia nas salas de aula, está distante da interação, vê-se mensagens do emissor ao receptor. É frequente ao professor o papel de repasse de informações e ao aluno de ser o estocador. Nem há duplo sentido - só ida, sem volta -, não se afirma a comunicação, os sujeitos não vivenciam a interação presente em Lévy, nem a interação está apenas entre os sujeitos que ele cita. O receptor não se expõe, não manifesta, torna-se inerte e isto lhe é comum, um hábito inquestionável.

O professor necessita por vezes estar na posição de receptor, permitir que o aluno questione, que proponha novas mensagens ou as mesmas mensagens por outras palavras; prever as possibilidades de rebate do aluno, propor situações que o permitam retrucar, instigá-lo à ‘remensagem’, ser ao máximo imediato no retorno. Descaracterizar os sujeitos, de que cada um tem um espaço exclusivo e que a cada um compete única função. Não é fácil, mas o planejamento, a intenção no que se propõe, a formação continuada, a reelaboração, o pensar sobre a ação, permite-lhe a constância e o ser mediador para uma sala de aula interativa.

O professor disponibiliza um campo de possibilidades, de caminhos que se abrem quando elementos são acionados pelos alunos. Ele garante a possibilidade de significações livres e plurais e, sem perder de vista a coerência com sua opção crítica embutida na proposição, coloca-se aberto a ampliações, a modificações vindas da parte dos alunos. Uma pedagogia baseada nessa disposição à coautoria, à interatividade, requer a morte do professor narcisicamente investido no poder. (MARCO SILVA, 2001, p. 9)
Se a interatividade não tem ocorrido entre os sujeitos, por vezes também não ocorre entre sujeito e instrumento tecnológico. Compreender uma nova simbologia presente nestes instrumentos inseridos nas salas de aula é árduo labor ao professor; mais ainda, utilizá-los na interação, para transformar qualitativamente o sujeito, está justamente na legítima mediação sujeito-instrumento-sujeito. Mas interagir - sujeito-instrumento - está além da compreensão de sua simbologia, de suas capacidades e potencialidades; o receptor não deve apenas querer uma nova face do instrumento segundo suas vontades. A emergência da interatividade é entendida:

“[...] não apenas como possibilidade de modificar o conteúdo da mensagem, mas como experiência inovadora de conhecer potenciada no universo infotécnico, como possibilidade libertadora da autoria do usuário sobre sua ação de comunicar, conhecer e criar.” (MARCO SILVA, 2000, p. 5)

Comunicar em sociedade, mais específico em educação, é desafio necessário aos indivíduos que não param, que de algum modo estão sempre se desenvolvendo. Há um entendimento que centraliza um destes atores, propondo aos demais serem os coadjuvantes. Ao desvelar esse exercício que tem formado praticamente todos os sujeitos, percebe-se que não é a inserção dos instrumentos tecnológicos a principal dificuldade aos profissionais.

Sendo o meio provocado com mais e mais instrumentos, comunicar é um desafio ainda mais necessário. Buscar a constância na formação, estar disposto e presente ao novo, experienciar, saber ouvir, instigar à fala, mediar, planejar… são para o professor, condições que tornam o diálogo possível e que contribuem à qualidade na educação. Uma educação que tanto padece de outros atores, que não só o professor.

A escola está neste ponto. O de lidar a cada instante com mais papeis, por exemplo, sendo sujeitada a metas que por vezes confrontam qualidade e quantidade, tomando esta última como a anterior. Professores sendo vigiados, desvalorização dos estudos pela família, desrespeito de governantes, estrutura física precária, bibliotecas e laboratórios fechados, projetos cancelados, etc. Não é objetivo fugir do assunto ou justificar a situação, mas é um desabafo necessário. É em cenários como o descrito que os sujeitos dialogam, comunicam, vivenciam o tecnológico; é este o que deveria ser o maior palco da educação.

A escola, de modo geral, tem lidado com questões anteriores às mídias vivenciadas atualmente. Os sujeitos que a habitam, são tão diversos quanto nos outros cantos da sociedade; se preparam com o que podem, idealizam, protestam, muitos se sobressaem às moléstias que os afligem – que se refletem na educação, outros, se deixam dominar. Há que perceber que se quis diferenciar no texto, mídias e instrumentos tecnológicos; entendendo que em mídias há um conjunto maior de recursos (indivíduos, propagandas, informações, emissoras, comércio, interesses particulares, etc.) capazes de mais influenciar que facilitar à comunicação (via de mão única). Por instrumentos, espera-se que a compreensão tenha sido apenas o das ferramentas que podem estar a serviço, neste caso, da educação, ou seja, que o sujeito-professor possa tê-la para exemplificar o mundo que cerca seus alunos, para promover o diálogo, para que possam intervir nas transformações que surgem a todo instante, e que se transformem. Isto faz a comunicação, isto é comunicação.


Referências

BEAUCLAIR, João. Educação e Psicopedagogia: Aprender e Ensinar nos Movimentos de Autoria. 1ª edição. São José dos Campos, Editora Pulso, 2007.

DURÁN, Débora. Os Impactos das Tecnologias da Comunicação e Informação na Educação: uma perspectiva Vygotskyana. GT 20 - Psicologia da Educação, USP. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/28/gt20.htm, acesso em 22 ago. 2012.

FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação? Tradução de Rosisca Darcy de Oliveira. 8ª edição. Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1985.

_____________. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. Publicação original 1996, digitalização 2002.

_____________. Pedagogia do Oprimido. 17ª edição. Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1987.

LÉVY, Pierre, As Tecnologias da Inteligência - o Futuro do Pensamento na Era da Informática. Tradução de Carlos Irineu da Costa. 2ª edição. Rio de Janeiro, Editora 34, 1993. Reimpressão 2011.

SILVA, Marco. Sala de Aula Interativa: A Educação Presencial e a Distância em Sintonia com a Era Digital e com a Cidadania. 2001. Disponível em: http://www.unesp.br/proex/ opiniao/np8silva3.pdf. Acesso em 07 set. 2012.

_____________. Interatividade: uma Mudança Fundamental do Esquema Clássico da Comunicação. Compós, 2000. Disponível em: http://www.senac.br/BTS/263/boltec263c.htm. Acesso em 07 set. 2012.


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